Esta é uma história de outros tempos, antigamente contada por um povo que escutava a sabedoria. Hoje em dia, os membros desta comunidade não percebem mais os significados, então pouco importa que esta história lhes seja ou não contada, pouco importa se eles a conservaram ou a esqueceram.
Mas prossigamos…. Esta história é aquela de quatro homens que viviam no mesmo quarteirão e tinham todos os quatro estudado as artes teóricas e práticas com os maiores sábios da época e levado tão longe suas pesquisas que todo o mundo estava persuadido que eles tinham atingido os cumes do conhecimento.
Mas um dia eles chegaram à seguinte conclusão: eles tinham agora que viajar e exercer seus talentos, porque não é dito que “aquele que tem o conhecimento e não o utiliza é pior que o imbecil”?
Nossos amigos se fizeram viajantes e buscaram todas as ocasiões de colocar seus conhecimentos em prática. Um fato conhecido – já se sabia antes e comprovou-se depois – que três destes sábios eram grandes conhecedores das artes e das ciências, tanto na teoria quanto na prática, enquanto que o quarto, se era menos célebre, era dotado de compreensão.
Após alguns dias nos quais eles passaram a se conhecer melhor, e após inúmeros debates e muitas discussões, os três primeiros sábios reconheceram que eles estavam no mesmo nível e estimaram que o saber do outro companheiro estava bem longe de igualar o deles; eles o convidaram então a deixar o grupo e voltar para casa. Como o quarto sábio se recusasse a deixá-los, eles lhe disseram: “Esta atitude não nos surpreende vindo de um ser tão insensível como você, incapaz de apreciar as grandes competências que somos, e se obstinando a se pretender nosso igual.” Entretanto eles o permitiram acompanhar-lhes, embora o excluíssem de seus sábios conciliábulos.
Acontece que um dia, enquanto caminhavam, os quatro sábios descobriram na beira da estrada uma certa quantidade de ossos aos quais ainda se encontrava ligado um pouco de couro e pelo – aparentemente os restos de um animal.
– Ah! – exclamou o Primeiro Sábio – com todo conhecimento que possuo, eu posso afirmar que é a carcaça de um leão.
– E eu – agrega o Segundo Sábio – meu conhecimento me permite reconstituir seu corpo em sua forma verdadeira.
– Quanto a mim – adiciona o Terceiro Sábio – eu tenho o poder de reanimar o inanimado e posso então injetar-lhe a vida.
Eles decidiram empregar seus talentos respectivos para fazer aquilo que sabiam fazer.
Mas o Quarto Sábio, puxando-os pela manga, lhes diz:
– Devo vos advertir que, ainda que vocês recusem minha competência e minhas capacidades teóricas, eu sou apesar de tudo um homem de compreensão. Efetivamente, como vocês perceberam, isto são os restos mortais de um leão. Tragam-no de volta à vida e ele nos aniquilará a todos!
Mas os três outros estavam bem mais interessados pela perspectiva de aplicar suas teorias e de continuar suas experiências. Num espaço de alguns minutos, o monte de couro e ossos se reveste de carne e eles viram se reconstituir diante de seus olhos um animal vivo, respirando e efetivamente muito perigoso – um leão.
Enquanto os práticos do saber estavam inteiramente voltados à sua operação, o Quarto Sábio subia nos mais altos galhos da arvore mais próxima, de onde pode assistir ao fim da experiência: ele viu o leão se lançar sobre seus companheiros, os devorar e desaparecer rugindo no deserto.
O único sobrevivente da expedição desceu da arvore e retornou ao seu país.